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O Professor e o Mestre na Universidade Pública (Vavá F66)

07/10/2016 - Por evaristo marzabal neves
Atenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.

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“Tudo que sei é que pouco sei; 

Porém, o pouco que sei,

é tudo o que

aos meus discípulos, passei”.

 (E. M. Neves).

Tenho perguntado aos meus alunos, se na Universidade Publica professor e mestre são sinônimos. Entre muitas respostas afirmativas e poucas em dúvida ou contrárias, vem o questionamento de possíveis diferenças ou complementações que dão sentido adicional à resposta da maioria. Na verdade, o professor ensina; o mestre ensina e orienta. Tem-se, portanto, uma complementação que é fundamental no treinamento e aprendizado de um universitário diferenciado e vocacionado à carreira que abraçou.

A contribuição da sociedade que mantém um ensino gratuito de alto nível, para uma minoria, exige que os benefícios sociais suplantem e muito os custos sociais de manutenção da Universidade Pública. Procura conscientizar o professor, que os recursos deslocados para o ensino universitário público não devem ser utilizados unicamente para sistematizar e transmitir conteúdo programático, uma vez que este modelo pedagógico, comum no ensino médio e cursinhos, treina o aluno para fazer provas, para passar no vestibular e não para a reflexão. 

Já ouvi que “ser mestre não é apenas lecionar, ensinar não é só transmitir conteúdos programáticos. Este é o papel do professor. Ser mestre é ser orientador e amigo, guia e companheiro, é caminhar com o aluno, passo a passo”. É transmitir a este os segredos da caminhada e constante reflexão e, também, aprender com o discípulo. Ser mestre é ser exemplo, exemplo de dedicação, de doação, de participação, de dignidade pessoal e, sobretudo, de amor. É preciso “fazer escola” e praticar cidadania, ainda mais, quando se é mantido por recursos públicos. Neste modelo de educação é que a sociedade sente e avalia a agregação de valor social.

E como se dá a passagem de professor de sala de aula para um mestre educador? Na Universidade Pública, inúmeros instrumentos pedagógicos e educacionais permitem um maior comprometimento e participação do docente na preparação para a vida pós-universidade do aluno, alicerçada no “hoje, o importante é a solução de problemas. O aluno deve pensar a respeito do que aprende e apreende em vez de apenas memorizar” (C. Sargo). Neste sentido, “aprender não é reter informação, mas gerenciar permanentemente o conhecimento, único jeito de alguém estar apto a lidar com as novas demandas profissionais” (G. Dimenstein), e, com um mercado de trabalho sempre em mudança.

No caso da ESALQ, estes instrumentos de apoio e contribuição à formação diferenciada do aluno são possíveis e se realizam nos estágios (voluntário, supervisionado, vivencial e profissionalizante), nos estímulos e motivações à iniciação científica e na participação e comprometimento em grupos de extensão de forte atuação não somente junto às empresas, mas também às organizações não governamentais, públicas e do terceiro setor, e ainda na assistência à pequena produção e famílias carentes. A aproximação com o mundo externo é importante para a compreensão do aluno sobre responsabilidade social, inclusive ética, e sobre os desafios do mercado. São lições de casa para o enfrentamento no dia seguinte à formatura.

Concluo com o que colhi ao compartilhar, vivenciar, indicar e orientar tantos jovens para os estágios (voluntário, supervisionado, vivencial e profissionalizante) e à iniciação científica, que muito aprendi e tenho aprendido com os jovens, facilitando minha tarefa na administração de ansiedades, no gerenciamento de inquietudes e controle de estresses, tão comuns no dia-a-dia de nossos orientados. É muito bom ensinar que o tecido social é cerzido com a convivência, conveniência, conivência e convergência de bons princípios e costumes e com o compartilhar do conhecimento científico e do relacionamento social. É transmitir que é ele que se insere na sociedade e não que esta existe para serví-lo.

Já que é a sociedade que mantém a Universidade Pública, o conhecido ditado “a pior hipocrisia é o egoísmo cultural” deve ser rejeitado, já que o conhecimento adquirido, por via pública, deve ser prontamente disseminado, vivenciado e repartido com os alunos. É a glorificação do Mestre. E, nesta mão dupla, não tenho vergonha alguma em confidenciar que muito tenho aprendido com meus alunos e corroboro que “aprendi muito com meus mestres, mais com meus colegas companheiros e mais ainda com meus alunos” (Talmude).

Esta amizade e companheirismo seguem em frente mesmo quando eles se vão. E, após vê-los formados e prontos para o mundo, bate uma saudade dos tempos que se foram, embora seja constante a renovação de jovens a procura de um orientador, de um educador. O Mestre fica torcendo pelo sucesso do discípulo que se vai e que ele se torne um mestre rapidamente, pois, desta forma, a corrente não se rompe. E o mestre, nestas lembranças, querendo cutucar o âmago de seu orientado, distante espacialmente, fica torcendo para que ele se lembre da canção do Toquinho que relata que “a vida segue sempre em frente, o que se há de fazer... só peço a você um favor, se puder, não me esqueça num canto qualquer”. Guarde-nos em sua alma. O mestre não é um ente frio, tem suas vaidades também.

Esta experiência e este aprendizado são muito construtivos e rejuvenescedores. Posso afirmar, como John W. Schlatter: “tenho um passado rico em memórias. Tenho um presente de desafios, aventuras e divertimento, porque a mim é permitido passar meus dias com o futuro. Sou mestre... e agradeço a Deus por isso todos os dias”.

Neste sentido, é maravilhoso estar com eles, se sentir um deles. É preciso compreender que ele é jovem. Daí ter vida o que sempre afirmo: “Viver entre os jovens é ficar sempre jovem; viver com os jovens é renovar, cada dia, no meu íntimo, o meu lado criança; viver para os jovens, educando e orientando-os, é sempre SER MESTRE e não, temporariamente, ESTAR professor” (E.M.Neves).

Evaristo Marzabal Neves/outubro 2002

 

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