A Jabuticaba que Virou Besouro... (Big-Ben; F97)

Casa Branca, 19 de junho de 2012, terça-feira *

Acabei de me lembrar de uma história bem pitoresca. E lembrei dela ao receber o e-mail de um dos alunos da Pós Graduação Lato Senso da Fundação Getúlio Vargas, onde ministro a disciplina "Cadeias Produtivas no Agronegócio".

O aluno, com um compromisso profissional, me pediu para atrasar em uma semana a entrega de um trabalho. Sem problemas, caso não aconteça com ele o que aconteceu comigo em 1996, na "Luiz de Queiroz".

A disciplina de entomologia exigia que os alunos entregassem um insetário, ou seja, uma coleção de insetos devidamente posicionados e classificados numa bandeja padronizada. A disposição dos insetos era previamente selecionada e as criaturas tinham todas que se apresentar daquela maneira.

Por "n" razões diversas, e nenhuma delas muito nobre como a do aluno da FGV - é verdade, eu atrasei o meu insetário. Faltavam criaturas um dia antes da entrega.

Com a maior cara de phasmatodea (os curiosos que procurem no google) fui pedir arrego ao professor, que gentilmente me deixou atrasar uma semana.

Parece até que ele sabia a lição que eu receberia.

Na semana seguinte, uma terça-feira pela manhã, ventava muito. E a qualidade do meu insetário recomendava que eu não saísse na rua com aquela bandeja, pois as asas das borboletas poderiam se despregar de suas donas.

Na época a República Jacarepaguá, onde eu morei, ficava na Governador Pedro de Toledo e a garagem dos carros ficava no quarteirão de trás.

Decisão aparentemente sensata. Deixo o insetário na mesa, dentro da república, pego o carro e paro na frente, eliminando os efeitos do vento sobre a bandeja. E assim o fiz.

Mas é aí que vivem as enormes oportunidades dentro de uma república. São aquelas raras chances de realmente, mas realmente, sacanear divertidamente alguém. E os meus amigos não perderam a chance.

Por azar meu, e incrível sorte dos demais, que se divertem até hoje às minhas custas, um dos moradores com hábitos pouco comuns resolveu, justo naquela manhã, sair de madrugada para catar jabuticaba na Esalq 

E eu nem me dei conta da sacola enorme, com jabuticabas, estacionada naquela cozinha. Eu, com pressa, pensava no café da manhã e em voar para a Escola.

Nem precisa dizer o que houve quando os demais desceram e viram a sacola de jabuticaba e uma bandeja de insetos, com 10 coleópteros (besouros) alinhadinhos, pedindo para serem substituídos...

Não deu outra!!!  

Entrei na república, peguei a bandeja e fui para a aula de entomologia. Tão logo o professor entrou na sala, atravessei o corredor todo de carteiras, parecendo um orgulhoso marechal em triunfo, para entregar o meu insetário.

Entreguei a bandeja e após o escutar o esperado "muito bom, Maurício", virei solenemente de costas e recomecei a jornada até a minha carteira.

No meio do caminho, uma risada alta e espontânea, seguida de um "por gentileza, senhor Maurício, volte aqui para classificar este inseto!!!".

Nem preciso dizer que durante os próximos 20 minutos de aula virei piada entre todos os alunos da sala, que fizeram fila para ver os nove besouros enfileirados com uma jabuticaba, todos corretamente dispostos, como mandava a regra dos insetários.

Dizem os mais novos que virou até slide de aula, uma pegadinha do professor que também era um grande brincalhão.

Bom, minha esperança era imaginar que outro pudesse ter comido o besouro no meio das jabuticabas. Mas disso nunca ninguém ficou sabendo.

E foi assim meu tempo de república. Nós nos divertíamos demais com essas coisas e tínhamos que manter a atenção redobrada com essas deliciosas sacanagens. Que saudades daquele tempo...

* publicado no dia 20/06 de 2012 no site da Bigma Consultoria, que foi posteriormente incorporada pela Agroconsult

Maurício Palma Nogueira,

Engenheiro agrônomo, formado na turma de 1997 da Escola Superior "Luiz de Queiroz", sócio e Coordenador da Divisão Pecuária da Agroconsult, Ex morador da República Jacarépaguá