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Ciência ou blefe? (Big-Ben; F97)

11/02/2021 - Por mauricio palma nogueira
Atenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.

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Recentemente, em um grupo de discussão de Esalqueanos que moram em São Paulo, falávamos sobre informações distorcidas geradas pela própria imprensa. Após opinar que só confiava checando as fontes nas bases, recebi uma provocação: como você faz para se informar?

 

Provocação estimulante porque eu mesmo não havia percebido que tenho mantido um procedimento simples. Me informo pelos veículos de imprensa, hoje 100% acessados (no meu caso) pelas plataformas online. Recebo uma ou outra revista em casa. As redes sociais, especialmente LinkedIn e Twitter facilitam a seleção do que será lido, além das colunas tradicionais. É interessante e vem de fonte confiável, eu acesso.

 

Mas quando se trata de assunto da minha área de trabalho ou de temas que eu queira opinar publicamente, aí a conduta é outra.

 

Vou ler e conferir a análise de articulistas, jornalistas ou não, que eu confio. De preferência mais de um e, nem sempre os mesmos. Nesse ambiente polarizado, diversos articulistas começaram a se deixar contaminar pelas suas preferências. Tanto do lado pró como do lado contrário ao Governo do momento, matriz principal dessa triste polarização que nos emburrece. E não é de hoje.

 

Nesse caso, procuro novos articulistas de confiança. A outra opção, caso ninguém dessa "seleção" pessoal tenha se manifestado, é buscar a base dos estudos ou pesquisas que acabam sendo citadas para defender um determinado ponto de vista. As agências de checagem de fakenews são boas para identificar essas fakes grosseiras, espalhadas há anos por seguidores messiânicos de várias vertentes. Os idólatras de políticos.

 

O problema surge quando as mentiras se originam ou são endossadas nos textos dos próprios jornalistas e veículos de informação.

 

Não se trata de uma acusação de má fé, embora também exista. Entre as principais causas estão os problemas atuais das redações. Queda nos orçamentos, dispensa dos profissionais mais experientes, sobrecargas nas equipes de produção e tudo isso ocorrendo em um ambiente caótico em termos de geração de informações. Não é exagero dizer que jornalistas são, em sua maioria, as maiores vítimas da produção profissionalizada de fakenews.

 

Mesmo assim, de forma inconsciente, acabam gerando informações incorretas, inverídicas ou tendenciosas, contribuindo com o problema. Isso ocorre pelo uso frequente de fontes despreparadas, desatualizadas ou mal intencionadas.

 

Tomando a sustentabilidade como exemplo, ao elevarem as Organizações Não Governamentais (ONGs) ao mesmo status de centros de pesquisa e universidades, a imprensa acaba por empobrecer o debate, ao invés de enriquecê-lo. 

 

Se houver um tema que gera algum conflito conceitual entre especialistas e pesquisas, serão elas que desempenharão o papel de fiel da balança. No entanto, o posicionamento das ONGs não é determinado pelo método de construção científica, mas sim por uma agenda.  E não há mal nenhum nisso. Associações de produtores, indústrias, sindicatos, grupos de discussão etc., todos possuem uma agenda. E todos representam algum tipo de organização da sociedade civil, expressão capturada pelas ONGs aqui no Brasil.

 

A argumentação de que ONGs atuariam de forma diferente por não terem fins lucrativos não procede. Parte do princípio ideológico de que a busca pelo lucro é, em si, um processo nefasto, predatório. Criou-se o mito de que ONGs não defendem interesses, mas sim a verdade absoluta gerada pela ciência.

 

O problema começa no debate.

 

O tempo curto para produzir e conferir as informações em um ambiente que, além de caótico, demanda textos minúsculos para tratar de assuntos complexos exige uma triagem de fontes preferencialmente exploradas.

 

Ao usar as ONGs como o fiel da balança, a imprensa desequilibra a exposição dos fatos, empobrece a discussão e, consequentemente, compromete o método de construção do conhecimento. Deveriam discutir como qualquer outra organização, profissionais ou empresas especializadas no tema, mas são apresentados como autoridades científicas.

 

As consequências são visíveis. Termos como "negacionistas" são usados para atacar até mesmo pesquisadores com extensos currículos construídos em instituições de alto nível. O objetivo é desqualificar, adjetivar e empobrecer o debate.

 

Negacionismo deveria se limitar àqueles que realmente negam a ciência, que acreditam em absurdos como o terraplanismo ou que vacinas servem para "chipar" a população. 

 

No entanto, passou a ser convenientemente adotado para calar questionamentos que deveriam ser usados para melhorar a produção do conhecimento. Ao invés da reflexão, a crítica ou questionamento acaba sendo vista como ofensa que deve ser combatida pela imposição, pelo grito, pela intimidação.  É a vaidade e a soberba falando mais alto.

 

É muito comum as pessoas falarem de ciência como se fosse algo simples, cartesiano. Mas ciência é complexa. Não envolve apenas a mensuração estatística de algo que se deseja medir.

 

Mais importante do que medir é definir o que será medido, como e quando será medido. Revisão bibliográfica, premissas, delineamento, espaço amostral, hipóteses etc. Por isso é comum, e desejável, que estudos sejam sabatinados e avaliados rigorosamente. O dissenso enriquece o processo, amplia os horizontes de revisão das metodologias, delineamentos, amostragens e por aí vai.

 

Quanto mais exposta a críticas e sugestões, melhor será a qualidade do conteúdo final. 

 

Inadvertidamente, a imprensa acaba predefinindo o que é ciência e o que não é, ao dedicar tempo a profissionais que acreditam em determinada linha, reduzindo o espaço ou até mesmo ocultando outras considerações.

 

E é nessa sombra de descuido que surgem os oportunistas. Alguns, inclusive, usados como fontes pela própria imprensa especializada.

 

Para fazer prevalecer seus pontos de vista, suas crenças, ideologias etc., emitem suas opiniões e lançam mão de um estudo para comprová-las. O estudo, publicado em revistas científicas, serve como o passe que dá o direito a opinar: "Minha opinião é essa, embasada nesse estudo".

 

Quem vai ler para conferir se a opinião ou o artigo está condizente com o estudo? Quantos destes terão condições para analisar os métodos utilizados e não apenas o resultado? E dentre os que podem, quantos irão querer se expor a um linchamento moral ao ser taxado de negacionista por uma máquina competente de comunicação que ainda conta com a simpatia da imprensa?

 

A vigarice intelectual navega. Poucos leem e quase ninguém critica de forma embasada, aprofundada. Não é difícil entender as razões pelas quais o QI (Quociente de Inteligência) médio da população mundial tenha se reduzido nos últimos 20 anos.

 

Artigos científicos não podem ser usados para censurar outras opiniões. Calar a boca dos que questionam, chacoalhando currículos e textos publicados é o contrário do que se espera da ciência.

 

Recentemente, um pesquisador renomado falou em um debate que só aceita contra-argumentos publicados na Science.  Por acaso, a revista, que tinha o objetivo de elevar o nível de conhecimento publicando estudos e artigos, virou um clube restrito que segrega os cidadãos do mundo em iluminados e incautos? Desde quando a ciência passou a temer o debate, o questionamento?

 

Irônico que esse mesmo pesquisador foi recentemente agraciado com uma homenagem internacional em nome da ciência. Merece? Sim, pela sua produção.

 

Mas e sua conduta em relação a outros cientistas e profissionais? Nesses casos, a lei de Liebig ou lei dos mínimos é sempre uma referência.

 

Esse tipo de postura é naturalmente perigosa. Certa vez, em meio a uma argumentação de conteúdo humanista e consciente, uma especialista ofendeu todos os taxistas, desqualificando e ridicularizando a importância de suas opiniões em assuntos triviais. A discussão era sobre política.

 

Essa cidadã, dona de um currículo espetacular e invejável, esqueceu-se completamente da noção de democracia, validando o embrião conceitual de um sistema ditatorial. Mesmo que de forma inconsciente, ela se julgou capaz e preparada para decidir o que é melhor para os ingênuos e ignorantes taxistas, segundo o julgamento dela.

 

O pior é que esse tipo de arrogância é muito comum em personalidades de alta exposição que deveriam se esforçar justamente em combatê-la.

 

Tomando como exemplo um assunto próximo de todos, e fora do agronegócio, vou usar o conteúdo de uma postagem dessa semana que criticava pais que imprimem castigos físicos aos filhos. A postagem lincava o endereço de um artigo científico que, em teoria, respaldava a opinião emitida.

 

Para o texto não ficar longo, eu inseri dois anexos, um explicando como o raciocínio foi desenvolvido e um outro com dois artigos que escrevi há cerca de 10 anos.

 

Ao analisar o artigo científico que em tese embasaria a associação do castigo físico à incidência de diversos problemas futuros, não se encontra nada que possa levar a essa conclusão. Trata-se de um blefe que usa um artigo científico para desencorajar ou calar qualquer opinião contrária.

 

O estudo serve a outro propósito e nem cita o assunto.  Não há a discussão de castigos físicos na educação. É totalmente impróprio usá-lo para discutir o tema. A vigarice intelectual não se envergonha ao usá-lo para endossar suas opiniões. E as pessoas acabam replicando sem ler, distorcendo o conceito de negacionismo para desqualificar aqueles que não concordam com as conclusões.  "Mas é ciência", dizem. Sim, é ciência, mas não confirma o argumento.

 

O tema movimenta emoções por razões óbvias. Que pai ou mãe gosta de castigar seus filhos? Falar "não" já é difícil, imagina colocar de castigo, dar umas palmadas?

 

É natural que a psicologia recomende o diálogo como matriz principal da educação. É a melhor maneira. É fundamental que se busque meios para reduzir ao máximo o uso do castigo físico como recurso.  Até que seja possível torná-lo raro. E assim vem acontecendo.

 

Os castigos das gerações mais antigas envolviam varas, vergalho, galhadas, chicote, cintadas, etc. Há 100 anos crianças recebiam a palmatória nas escolas e ajoelhavam em milho. Foi a geração que derrotou o nazismo e o fascismo ao mesmo tempo e estabeleceu as bases para a maior revolução tecnológica que se iniciaria décadas depois.  Hoje se fala em palmadas e, quiçá, uma chinelada.

 

Nunca conheci alguém que defendesse a violência. Nunca vi alguém relativizar pais e mães, bêbados ou frustrados, que descontam sua má sorte nos filhos. Colocar essa violência como proporcional a castigos educativos, aplicados com amor e dor, é leviano, desonesto, baixo e inescrupuloso. Trata-se de preconceito, de uma postura arrogante em querer fazer prevalecer a sua própria cultura.  E como não há dados que justifiquem essa imposição, mentem sobre pesquisas.

 

Até o momento, a ciência não gerou nenhum dado estatístico que comprove a relação de um castigo físico a problemas. E o dia que sair a primeira pesquisa, a sociedade terá que ficar atenta para que tragédias não sejam implementadas com impactos duradouros a partir de conclusões heroicas baseadas em estudos incompletos.

 

Na ausência de estatísticas, as decisões precisam ser embasadas na experiência, no histórico de decisões certas e erradas. Vale o conhecimento gerado na própria família e seu entorno. Não se trata de impor maus tratos, mas sim de estabelecer limites. E não haverá uma regra, pois as crianças reagem de formas diferentes. Existem famílias que há gerações não precisam impor castigo. E há famílias que alguns filhos precisam e outros não.

 

Por isso o debate é importante. É preciso discutir as opções de maneira franca, aberta e não taxativa. Essa postura pseudo-científica impede o desenvolvimento de instruções bem elaboradas. Explicar o momento correto e formas de lidar com a criança até chegar a uma palmadinha não é melhor do que deixar que os pais acuados, frustrados, nervosos percam o controle diante de uma situação desesperadora?

 

Será que o radicalismo em lidar com esse assunto, impedindo um debate franco, não estaria criando o efeito inverso em algumas famílias? Se estiver, quantas seriam? Tem que estudar. 

 

E estudar adequadamente o tema não será tarefa fácil. Para considerar o perfil das crianças será preciso avaliar todas as variáveis, do útero aos primeiros passos, que possam interferir na personalidade.

 

Em um eventual estudo sobre comportamento, além dos controles, é preciso estudar os impactos de outras questões que possam envolver uma flexibilização no estabelecimento dos limites. Um exemplo sempre em discussão é que os pais podem impor os limites conversando com a criança até que ela entenda e aceite os limites. Sim, é verdade.

 

Mas é interessante mostrar para a criança que pode ser ela, e não os pais, quem definirá o momento de compreensão desses limites? Uma questão menor, corriqueira, pode ser tratada da mesma forma que uma birra feita em um estacionamento com alto risco de exposição para toda a família?

 

De novo, não há estatísticas, não há evidências, apenas opiniões. E mesmo que houvesse estatísticas, elas seriam favoráveis?

 

Esse assunto é relativamente recente. Coincide com o surgimento e aumento do desrespeito e até agressões a professores. No mesmo período, vimos casos de espancamento de crianças por outras crianças em escolas. Não se trata daquele "vou te pegar na saída", seguido de uma troca de sopapos.

 

É gente machucada, hospitalizada, chutada no chão até urinar nas calças de medo. Adolescentes se orgulhando disso e postando na internet. Tudo isso acontece justamente no mesmo período em que se começa a constranger pais que promovem castigo físico? É coincidência ou tem relação? Precisa estudar.

 

Todas as opiniões valem. E quanto mais discutirmos, melhores serão as decisões. Assim como acontece com a ciência.

 

A discussão precisa ser honesta e ampla. Como foi criada a criança que, depois de crescida, planejou e coordenou o assassinato dos pais enquanto dormiam? Como foram criadas as que arremessaram a filha pela janela de um prédio?

 

Como foram criadas as crianças que anos depois viriam a se divertir queimando um índio que dormia em um banco de praça pública?

                 

Apanharam pouco ou apanharam muito? Tinham noção que seriam responsabilizados pelas suas ações ou tiveram dificuldades para identificar limites?

 

Esse raciocínio que qualquer castigo físico seja comparável a um ato de violência contra a criança é consequência do empobrecimento intelectual que estamos vivendo. Apenas pessoas extremistas não reconhecem o meio, o adaptável, o que evolui. Por desonestidade, carregam uma legião de pessoas de boa fé que acreditam que se trata de uma opinião embasada.

 

Que tipo de criação tornará as crianças mais propensas a causar violência física e moral? É preciso responder.

 

Não sei se a minha opinião é a correta. No meu entorno, estatisticamente, não tenho dúvidas tanto em relação aos castigos como em relação às faltas de limites.  Mas a amostra é pequena, inclui familiares de diversos graus e amigos do convívio. No entanto, é o que o tenho à minha disposição.

 

Posso confiar na minha experiência, ou posso acreditar em alguém que defende seus pontos de vista usando estudos que não dizem nada a respeito do que estão defendendo.

 

Você apostaria o futuro de seus filhos nas recomendações de alguém que defende seus argumentos com base na vigarice, no estelionato?

 

Ciência não pode ser usada como blefe. A sociedade pagará muito caro por esse tipo de descuido, que abre microfone para quem se julga no direito de impor suas crenças pela mentira. Já há sinais de que esteja acontecendo.

 

Maurício Palma Nogueira (Big-Ben, F-97) é engenheiro agrônomo, sócio da Athenagro, coordenador do Rally da Pecuária, ex-morador da República Jacarepaguá

 

ANEXO 1 - Processo de desenvolvimento do texto e observações sobre o estudo

 

O link para o Artigo científico citado em postagem que associa palmadas e castigos físicos à violência na adolescência ou idade adulta: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81231999000100009    

 

Optei por deixar o raciocínio original, sem revisões na linha de argumentação. Não excluí nem um erro que cometi no início ao confundir do que se tratava o conceito de negligências. Eu acreditava se tratar na negligência na educação e não com relação à criança, por abandono, falta de afeto, etc.

 

Deixando o original, mostro que já inicio de forma tendenciosa por não se tratar de

um assunto novo para mim. Há 10 anos haviam feito a mesma coisa que se repete no momento. Citaram pesquisas, disponibilizaram links, mas os textos originais não confirmavam as conclusões.

 

Ao longo do raciocínio, vou percebendo que a má fé não é culpa dos autores. Pelo menos não na forma com que acontece em vários artigos da área de sustentabilidade em pecuária, em que os próprios autores mencionam ou destacam na conclusão algo que não se confirmou como resultado da pesquisa.


Embora seja fácil hoje, não chequei se os autores se posicionam sobre o tema, direcionando às pesquisas.

 

Enfim, segue a construção do raciocínio, com trechos do estudo original que achei relevante ir destacando durante o processo de análise.

 

Pesquisadores da área de saúde sugerem que a violência interpessoal e as negligências que ocorrem no ambiente familiar sejam responsáveis por grande parte desses atos violentos (Minayo, 1994).

 

No começo do texto, espero ler até o fim a definição de negligências e violência interpessoal.

 

Onde está o limite de ambos? Se não estiver nesse artigo, o correto seria ler toda a produção do "Minayo, 1994" para formar uma opinião.

 

Se não aprofundarem por aqui, há o risco de que esteja sendo citado apenas para validar a amplitude e abrangência de uma pesquisa bibliográfica mais ampla. Será mesmo? O texto dirá, mas pode ser outro truque muito usado nos dias de hoje. Engordam as referências bibliográficas com autores que não serão usados no contexto correto, citando algumas frases soltas, etc.

 

Apesar de a violência familiar ser descrita desde a antigüidade, somente há cerca de 30 anos é que o tema vem sendo sistematicamente discutido por pesquisadores da área de saúde (Straus & Gelles, 1995; Gelles, 1997).

 

Ainda sobre a importância de definir violência e negligência. Será que justamente recomendações que não consideram essa definição não esteja na raiz de alguns dos problemas contemporâneos?

 

Perda de QI nas novas gerações, professores sendo agredidos nas escolas, violência entre alunos, espancamentos, ofensas, etc. Isso não existia antes. Pais eram respeitados, professores eram respeitados, independentemente do período e da linha de governo no poder. Era a educação em casa e não os militares no poder como muitos defendem.

 

No Brasil, praticamente todas as famílias têm uma história sobre como uma criança foi educada depois de um furto de algum bem. O que furtou, o que os pais fizeram para devolver, como ficou humilhado e a "surra": Violência? 

 

A importância dada ao problema, não só no meio acadêmico como também na imprensa e no restante da sociedade civil, é conseqüência direta das estatísticas alarmantes encontradas ao longo dos últimos anos.

 

Na área de sustentabilidade, e na recente discussão sobre vacinas, um dos maiores problemas é a interferência da imprensa e da sociedade civil (que virou equivocadamente sinônimo de ONGs).

 

Ao optar por tratar ONGs como especialistas, a imprensa erra feio na construção das matérias. Se houver um tema que gera algum conflito conceitual entre especialistas, as ONGs passam a ser o fiel da balança. No entanto, o posicionamento das ONGs não segue o método de construção científica, mas sim uma agenda. A agenda, mesmo que legítima, será tendenciosa quando houver um contraditório entre especialistas.

 

Um exemplo de simplificação da conversa. Nunca li ou escutei alguém que defendesse a violência. Mas há uma discussão legítima dos métodos limites para combater a negligência na educação. Vale a pena calar esse debate?

 

A questão procede e não se trata de maus tratos, mas sim de limites.

Como foram criadas crianças como Alexandre Nardoni e  Suzane Richthofen? E aqueles jovens que, no início dos anos 1990, queimaram um índio que dormia em um banco? Foram criados com excesso de violência na infância ou com falta de limites?

 

Voltando às próprias famílias e convívio, quantos são os casos de problemas que vieram dos que foram criados sem limites? E quantos são os casos dos que se tornaram problema por serem educados com alguns castigos físicos, desde que garantido o bom senso e o cuidado?

 

Problemas como drogas, desrespeito, falta de educação, preconceitos, racismo, etc.

 

Que tipo de gente está mais propensa a causar uma violência moral? Certa vez, em meio a um texto humanista e consciente, a articulista ofendeu todos os taxistas do mundo, desqualificando e ridicularizando a importância de suas opiniões a assuntos triviais. A discussão era política e essa cidadã, com um currículo espetacular e invejável, esqueceu-se completamente da noção de democracia. Sem contar a falta de respeito e empatia, ao desqualificar a capacidade de um grupo em decidir ela validou o embrião básico de um sistema ditatorial.

 

Mesmo que de forma inconsciente, julga-se capaz e preparada para decidir o que é melhor para os ingênuos taxistas (no exemplo dela)?

 

Essas colocações não são estatísticas, mas são parâmetros essenciais para definir premissas para novos estudos e discussões. Discutir violência sem defini-la não levará a lugar algum.

 

Não podemos tratar do assunto com leviandade. Qualquer decisão impactará gerações, vidas, histórias, etc.

 

Ademais, é importante reconhecer que a maioria das estimativas existentes na área reflete somente os casos mais visíveis e/ou graves de violência familiar.

 

Portanto, não é possível incluir pequenos castigos físicos nas conclusões. São hipóteses, simulações, teses que precisam estudadas. Qualquer comunicação que não reflita a construção do método científico ofenderá a própria definição da ciência.

 

Apesar das dificuldades apontadas, os resultados de algumas pesquisas nacionais indicam que a violência familiar no Brasil também é expressiva, devendo ser encarada como prioridade na agenda do Estado (Deslandes, 1997; Brasil, 1997). Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar realizada no ano de 1988 (IBGE, 1989), 55% das mulheres vítimas de agressão na Região Sudeste do Brasil haviam sido vitimizadas em seus próprios lares, sendo que, em 62,2% dos casos os agressores foram seus parentes ou conhecidos. No caso das crianças e adolescentes a proporção é ainda maior. Segundo a pesquisa, 80% das agressões físicas foram perpetradas por esses agressores.

 

No estado do Rio de Janeiro, estatísticas da polícia civil do ano de 1991 indicam que cerca de 70% dos homicídios de crianças de zero a onze anos foram perpetrados pela própria família (Soares, 1997). A magnitude da violência domiciliar também pôde ser evidenciada no inquérito realizado, durante os anos de 1990 e 1991, com escolares do município de Duque de Caxias. Nessa pesquisa, cerca de 33% das crianças e adolescentes entrevistados relataram a ocorrência de atos violentos na relação entre pais e filhos em seus domicílios (Assis, 1992).

 

Mesmo que ainda insuficientes, as estatísticas apresentadas acima apontam para um cenário merecedor de enfrentamento imediato.

 

Não há dúvidas que o combate à violência mereça atenção, mesmo que seja estatisticamente baixo. O objetivo deve ser zero.

 

Mas faltou divulgar, nas estatísticas, as incidências de casos por números de habitantes. Precisarei checar as figuras do estudo.

 

Iniciando uma descrição das linhas de investigação na área de violência familiar, vale ressaltar que a complexidade do fenômeno impõe que o conhecimento a ser produzido seja necessariamente construído por profissionais de diferentes áreas, destacando-se, entre outros, os profissionais de saúde, os cientistas sociais e os antropólogos.

 

Não seriam essenciais profissionais da área de educação na mesma proporção de importância que os da área social? 

 

Um segundo grupo de trabalhos é constituído por estudos de freqüência (incidência, prevalência e freqüências relativas), que procuram dimensionar a magnitude da violência e identificar a sua importância com relação às demais violências, às outras causas externas e aos outros agravos em geral. Tradicionalmente, a epidemiologia é a disciplina que mais tem contribuído para o avanço do conhecimento na área.

 

A questão negligência também deveria ser considerada como uma das variáveis impactantes nesse grupo de estudo. Qual o risco de criar um problema maior tentando combater um problema real, mas difícil de dimensionar?

 

De acordo com a revisão bibliográfica realizada, os estudos abordam, principalmente, os fatores pessoais/psicológicos dos indivíduos envolvidos; a história de violência em gerações anteriores ou em idades mais precoces; fatores ambientais e sócio-econômico-culturais dessas famílias; e as características situacionais presentes nos momentos de violência familiar; estes últimos, os efetores mais diretos na ocorrência da violência.

 

Minayo, 1994... vamos ver.

 

Independentemente da forma de apresentação da violência, quer física, psicológica, sexual ou por negligência (Brasil, 1997), um expressivo número de autores aponta que as principais conseqüências dos maus-tratos na infância ocorrem no desenvolvimento infantil nas esferas física, social, comportamental, emocional e cognitiva (Kashani et al., 1992; Straus & Gelles, 1995; Gelles, 1997).

 

Gera uma dúvida com relação ao início do artigo. Estamos falando da negligência com a educação ou negligência na criação da criança, abandono, etc. Se for esse último o caso -  o que parece ser - a questão passa a ser pior do ponto de vista ao uso desses artigos, textos e opiniões formadas com base nesses estudos.

 

Estamos falando apenas de violência explícita mesmo. O estudo é claro quanto a isso. Aí melhora a análise do estudo mas em hipótese alguma ele poderia ser usado como argumentação para questionar o impacto do castigo físico na educação. Não há como analisar esse caso sem considerar a negligência na educação e não a negligência com a criança.

 

Fundamental lembrar que castigos físicos, em si, já se reduzem. Famílias que viram seus ancestrais apanharem com varas, cintas de couro, vergalhos, ramos, etc, agora adotam palmadas, chineladas e leves puxões de orelhas, etc. Nada que machuca, mas que mostra limite. O castigo físico já foi mais violento no passado.

 

Está certo usar o castigo físico? Não dá para saber porque não existe ciência sobre o tema. Existem opiniões. E quando se trata de opiniões, os exemplos mais próximos são nossas melhores fontes.

 

Podemos esquecer o Minayo, 1994. Nesse contexto, essa preocupação perde importância por ele estar falando de negligência com a criança e não na educação.

 

Recentemente, estudos vêm apontando uma relação entre história de violência familiar na infância e criminalidade na adolescência (Widom, 1989; Aber et al., 1990). Em vítimas de abuso sexual, também é descrita uma inter-relação dos agravos mencionados acima com comportamentos sexuais incompatíveis com os esperados para a idade (Kendall-Tackett et al., 1993).

 

Está aí uma argumentação sempre colocada contra as palmadas. É uma conclusão honesta? Ou se trata de artigos lidos sem o devido cuidado para evitar comprar conclusões tendenciosas? Ou que nos agradam?

 

 

Alguns autores abordam o tema estudando um quadro complexo conhecido como "síndrome de privação materna" (Whitten et al., 1969). Essas pesquisas sugerem uma relação entre os cuidados com a criança, o estado psicológico e emocional da mãe e a falta de crescimento físico na infância. São sugeridos dois processos básicos para a ocorrência de agravos nutricionais em crianças submetidas a tal situação.

 

Apareceu uma questão interessante para o tema de educação familiar em um ambiente normal, que não inclua desequilibrados e bandidos. A palavra "sugere" decepciona e demanda maiores investigações incluindo também as causas do estresse. É relacionado apenas a violência ou envolve também questões financeiras, amorosas,  trabalho, receio, depressão, etc., etc., etc.

 

Como sugere a Figura 1, as estratégias de ação sanitária no âmbito da violência familiar podem ser encadeadas em três etapas distintas. A de prevenção primária envolve, por exemplo, a incorporação de atividades de educação em saúde às rotinas dos serviços; as atitudes e comportamentos frente aos conflitos familiares; a importância de a violência familiar tornar-se pública; as possíveis apresentações da violência e suas principais características; as informações sobre locais de atendimento a vítimas de violência familiar; e a importância da notificação são alguns dos pontos que poderiam ser trabalhados.

 

Nitidamente o estudo se dedica a casos de violência. Não se trata e nem tem a pretensão de discutir castigos físicos na educação. É incorreto usar o estudo para discutir o tema. Resta saber se a vigarice intelectual é dos autores ou de quem usa a ciência para justificar suas crenças dando carteiradas e taxando os demais de negacionistas.

 

Qualquer semelhança não será mera coincidência.

 

Considerações finais

 

As considerações finais dos autores são extremamente honestas e coerentes com o estudo que foi conduzido.

 

Portanto, por esse documento, a desonestidade intelectual em usar esse estudo para falar de castigos físicos na educação não partiu dos autores. A menos que tenham postado algo e apresentado o link do estudo.

 

Está muito na moda hoje, pois ninguém lê mais nada em profundidade. Mas, como ensinavam os romanos, "in dubio pro reo". Dentro do que li, os autores foram coerentes com o que levantaram. Não usaram das considerações finais para validarem suas crenças.

 

Agora levando casos como esse para dentro de casa. Quem está disposto a apostar o futuro do seus filhos em posicionamentos que defendem suas recomendações citando pesquisas que não dizem sobre o assunto?

 

O que é melhor? Usar de uma palmadinha leve para impor limites a uma criança que não atende ao diálogo?

 

Ou arriscar seguir recomendações de quem as apresentando estudos que não trataram do tema?

 

De um lado uma crença que faz todo sentido, apesar de ser defendida com base em informações interpretadas de maneira desonestas. Nenhum bom pai ou mãe gosta de castigar, de dar ou até uma palmada em filho. Do outro lado toda a história de experiência humana que nos permitiu chegar até aqui.

 

Vale lembrar aquele estudo da queda de QI e os diversos casos de desrespeito com professores. Quem é, ou tem algum parente, pode falar melhor.

 

ANEXO 2

 

Morte às palmadas!!, julho de 2010

 

Faz tempo que vejo com maus olhos a tentativa de alguns setores da sociedade em reprimir as palmadas dos pais em seus filhos.

 

Tempos atrás até participei de uma discussão dessas pela internet. A receita dos defensores dessas bandeiras é a mesma de sempre: não há meio termo. Não existe, para eles, os pais que usam a palmada educativa. Se os pais não usam apenas a conversa, já partem para o espancamento.

 

Estes dias vi as falas de um assessor do ministro Paulo Vanuchi dizer que as palmadas são o caminho para violência sem limites, com olhos roxos, fraturas, marcas de cigarro na pele, etc. O pai começa com a palmada e logo partirá para o espancamento.

 

Quanta ignorância. Bom, o que se esperaria de um assessor do Paulo Vanuchi? Só pode vir ignorância por parte da equipe de um defensor de medidas para cercear liberdades.

Bom, o fato é que as palmadas nos filhos podem virar crime, segundo projeto do Governo.

 

É evidente que ninguém apoiaria pais bêbados ou frustrados descontando suas mazelas nas crianças. Mas e a palmada educativa?!

 

Não posso deixar de ver com maus olhos os psicólogos que defendem a criminalização das palmadas. Para mim, o raciocínio é bem simples. Limitem os pais, limitem a educação e teremos (nós psicólogos) um mercado garantido para o futuro.

 

Que bela estratégia de marketing. Deixa a molecada sem rédea e no futuro teremos uma legião de pais e filhos para atendermos em nossos consultórios.

 

Famílias desestruturadas por problemas ao redor de filhos, consumo de drogas, desrespeitos e abusos entre adolescentes, falta de limites, moleque que divulga fotos da namorada na internet, estupro, problemas com a autoridade dos pais, etc.

 

Interessante. Dificulta-se a imposição de limites para que no futuro, em sessões caras e exaustivas, pais, filhos e psicólogos tentem descobrir o que deu errado. Quem ganha com isso?

Antes que me critiquem, não estou exagerando e nem generalizando. Há uma grande parcela de profissionais - sejam psicólogos ou psiquiatras - que defendem o uso das palmadas ou punição física dos filhos, desde que com bom senso.

 

E foi no relato de um desses que eu me deparei com o conceito de Id e superego.

Bom, segundo o relato do profissional - que não lembrarei o nome - as palmadas e demais punições físicas, leves, ajudam a moldar e estruturar o superego da pessoa.

 

Para explicar os conceitos, lancei mão de uma rápida pesquisa pela internet. Superego designa, na teoria psicanalítica, uma das estruturas do aparelho psíquico. É a parte moral da mente humana e representa os valores da sociedade.

O objetivo do superego é impor limites de acordo com as regras aceitas na sociedade e forçar o indivíduo a se comportar de maneira moral.

 

O superego forma-se após o ego, durante o esforço da criança de internalizar os valores recebidos dos pais e da sociedade, a fim de ser aceito ou simplesmente receber respeito, amor e afeição.

 

O superego divide-se em dois subsistemas: o ego ideal, que dita o bem a ser procurado, e a consciência que determina o mal a ser evitado.

 

O Id, por sua vez, é a fonte da energia psíquica (libido). O id é formado pelas pulsões - instintos, impulsos orgânicos e desejos inconscientes.

 

Ele funciona segundo o princípio do prazer, buscando atender as vontades. Não faz planos, não espera, busca uma solução imediata para as tensões, não aceita frustrações e não conhece inibição.

 

O Id desconhece juízo, lógica, valores, ética ou moral, sendo exigente, impulsivo, cego irracional, anti-social, egoísta e dirigido ao prazer. O id é completamente inconsciente.

 

Psicanalistas dizem que ambos (Id e superego) devem estar equilibrados proporcionalmente nas pessoas. O Id é vontade, impulsiona e dá energia para a criação. O superego estabelece os limites.

 

Com o superego muito elevado em relação ao Id, a pessoa se limita demais, sofre, não cria. Por outro lado, quando o superego é fraco a pessoa torna-se irresponsável, sem limites, dá problemas.

 

Voltando à rápida pesquisa na internet, encontrei a seguinte afirmação no Wikipédia: "Os psicopatas têm um Id dominante e um superego muito reduzido, o que lhes tolhe o remorso, sobressaindo a falta de consciência".

 

Credo!!!! E é credo mesmo. Quanto mais os pais forem limitados a educar, mais difícil será imprimir os conceitos nas crianças, futuros jovens, e talvez futuros adultos.

 

Quando eu saía dos limites, meu pai me batia. Com a idade a punição evoluiu: palmadas, chineladas e cintadas. Depois da educação, meu pai me depositou tanta confiança que eu passei a enxergar- em meu pai - mais que um pai, um amigo. 

 

Pensei milhares de vezes antes de escrever o parágrafo acima. Isso aqui é público e quem ler poderá julgar mal as coisas, dizer que meu pai espancava.

 

Nunca em toda a minha infância, e na de meus irmãos, houve sequer uma marca, um vergão ou roxo que fosse proporcionado pelos castigos de meus pais.

 

Chamávamos de "surra" porque era uma surra muito mais moral do que física. Claro que assim como todos os pais que amam os filhos, a força das palmadas, chineladas e cintadas eram dosadas.

 

Não eram para machucar, não eram ações de raiva. O objetivo era nos mostrar que a partir daquele momento, estávamos praticando transgressões inaceitáveis. A atitude dos pais era um sinal.

 

Por isso não ficava marca. A marca que ficava era em nossa consciência, em nossa noção do que é certo ou errado. Era o superego sendo construído.

 

Por isso as palmadas não eram constantes e por qualquer motivo. A conversa sempre era a primeira medida; e muita conversa, muita instrução. Depois vinha a bronca, ou uma conversa mais severa com advertência. Depois o castigo ou o limite a coisas que gostávamos, como sair para jogar futebol por exemplo. O último caso era a punição física, com as palmadas e chineladas.

 

Não eram nossos pais que nos davam palmadas. Éramos nós quem pedíamos ao avançar os limites.

Quando finalmente saí de casa para estudar engenharia agronômica na "Luiz de Queiroz" eu não teria mais meus pais ao meu lado. Fui morar em república e meus pais só puderam contar com a certeza de que a educação estava completa.

 

Estava mesmo? Acho que não. Faltava o grande teste, faltava a hora da verdade em que eu mesmo administraria meus limites.

 

Fiz besteiras, é claro, como todo mundo. Faltei em aula para ir a bares, fui para boates, atravessei a noite, bebi com amigos, abandonei provas, não fiz trabalhos de disciplinas, farreei mesmo e muito.

 

Mas foi minha educação que me fez negar as drogas. Sem que meu pai conversasse comigo uma vez que fosse sobre o assunto, consumir droga era inaceitável para mim, um limite que eu nunca ultrapassaria.

 

Foi meu senso de limite que me fez respeitar a dignidade das moças com quem me envolvi. Nunca as desrespeitei e sempre que passei dos limites por imaturidade ou pelo excesso de ceda líquida, pedi desculpas.

 

Foram estes mesmos limites que me fizeram agir como um bom ser humano respeitando o próximo, independente de suas opções, classes sociais ou cor. 

 

Eu tive que aprender a dosar até onde poderia ir e em que momento teria que parar para estudar ou ir à Escola.

 

Meus pais não estavam lá para me dizer os meus horários.

 

Meus pais nunca me ligaram para checar horários, nunca fizeram uma visita de surpresa, nunca perguntaram sobre minhas notas e nunca foram atrás de professores ou funcionários para saber como eu me comportava em Piracicaba.

 

Confiaram na educação que me deram. A partir lá, eu deveria agir por mim mesmo. Os telefonemas, as visitas ou conversas com professores ocorriam apenas para saber como eu estava e nos eventos organizados pela república, em que convidávamos os familiares, amigos e professores.

 

Meus pais nunca viram uma conta sequer da república e nunca tiveram acesso a que tipo de alimentação tínhamos ou ao que guardávamos em nossos quartos. Só entravam se convidássemos.

 

Literalmente eram visitas.

 

Relapsos? Claro que não. O que poderiam ter feito já havia sido feito. Agora era com a gente.

 

Como admiro a forma com que fui criado. Como admiro a firmeza de meus pais na condução de nossa educação, tanto no processo todo como em saber o momento exato em que deveriam "retirar-se" de campo.

 

Meus pais passaram de educadores a conselheiros. Eu daria todo o pouco que acumulei até agora para passar apenas mais um dia que fosse conversando com o meu pai que, infelizmente, se foi em 2005. 

 

E agora querem transformar meus pais em criminosos por causa das palmadas.

 

Justificam essa atitude buscando extremos, exemplificando suas teses invertidas com aqueles pais que batem nos filhos para afastar suas frustrações, ou castigar alguém por suas vidas medíocres e sem sentido.

 

Está tudo errado. É outro exemplo típico de inversão de valores. Como também devem achar comum que os pais vigiem e fiscalizem a faculdade de seus filhos, suas notas, seus professores, suas repúblicas, a escolha de suas namorada(o)s.

 

E depois? Os pais se mudam para a casa de seus filhos para dizer a eles que contas devem ser pagas?

As vezes me assusto com o "emburrecimento" da sociedade em aceitar tal discussão, assim como outras tão estúpidas quanto.

 

Não se trata de defender que educação ocorre apenas aos "tapas", sem conversa. Nunca foi assim em minha família.

 

Trata-se de entender que o ser humano busca ultrapassar os limites, inconscientemente. Esse é o tal do Id, conforme escrito anteriormente.

 

Na infância os limites precisam ser estabelecidos e, felizmente ou infelizmente, os tapas e chineladas são uma forma de mostrar que "aquele" determinado limite é inaceitável.

 

Este tema é mais um exemplo de que o Brasil é representado por gente tão despreparada que não consegue nem diferenciar o que é dever do cidadão e do Estado. Uma pena!

 

E as palmadas? Morreram mesmo?,  julho de 2011

 

O voo foi na última quarta-feira. Eu estava cumprindo a minha volta de São Félix do Xingu, onde fui ministrar uma palestra no sindicato rural.

 

Já estava na terceira das quatro pernas (trechos) que faria naquele dia. Cansado pra valer, dormindo pouco, aliando estradas com pendências e novos projetos, uma correria alucinante.

 

Na minha frente sentou uma mãe com uma criança. A moça, novinha, discreta, parecia um pouco preocupada talvez por não estar habituada a voar. Tem muito disso hoje em dia. O menino devia ter uns cinco anos e começou a fazer birra, pois não queria ir embora. Normal também, acontece em quase todos os voos.

 

Mas nesse caso o menino se recusava a sentar, berrava e chorava enquanto o avião já estava taxiando. A comissária de bordo foi até a poltrona e disse com toda a calma para a mãe do menino:

"Olha minha senhora, ele precisa sentar. Mesmo que chore, grite, se ele não sentar e colocar o cinto de segurança, nós teremos que abortar a decolagem".

 

Não sei porque, mas na hora a primeira expressão que veio na minha cabeça foi "pedala Robinho!!!!!".

Imagina?! Um Airbus 319 (acho que era um desses) cheio de passageiros cancelar a decolagem por causa de um menino birrento?!?!?

 

A mãe, claro, morrendo de vergonha pegou o menino para colocar na cadeira e o moleque a encheu de bofetada e chutes no rosto, na perna, no corpo e assim por diante. Xingava bastante, além de bater. Nada dele sentar e o avião chegando na cabeceira da pista.

 

Na minha cabeça, agora o "PEDALA ROBINHO!!!!!" era bem mais alto. Ai moleque, se esse pássaro metálico voltar pro ninho...

 

Por fim a mãe deu uns tapinhas e um "chacoalhão" no moleque, e o colocou à força na poltrona. A comissária checou e o voo prosseguiu.

 

Os tapas da mãe no menino não o machucou, mas o colocou no seu devido lugar, o de respeitar os pais.

 

Como sei disso?  Porque o menino não chorou mais e não houve exagero da parte da mãe; foi umas palmadas normais. Depois disso a mãe, discretíssima, ainda ficou na orelha do menino rezando um sermão que até eu fiquei com medo na poltrona de trás.

Ela se impôs, e se impôs firme. Pela reação do menino, que logo começou a pedir "desculpa mamãe", a educação dele não aparenta ser falha. Muito pelo contrário, pois o menino veio quietinho e tentando puxar papo com a mãe durante todo o trecho de Marabá até Brasília.

 

A pergunta que fica é se nesse caso a palmada foi acertada ou não? O que aconteceria se a mãe não se impusesse pelo limite físico, mesmo que essas palmadas não machuquem a criança?

 

Por causa de um menino birrento, e sem limites, é justo que tantas pessoas fossem prejudicadas com atrasos e prejuízos, inclusive de ordem direta no caso da companhia aérea?

 

É preciso rever essa questão das palmadas nas crianças. Essa interferência de psicólogos abobalhados na forma de educação dos pais está equivocada. É coisa de gente teórica que quer filosofar diante da necessidade de ação.

 

Na verdade, no caso das palmadas de pais de bom senso, a dor é mais moral do que física.  Evidentemente que não estamos falando de desequilibrados ou pinguços que espancam os filhos. Estamos falando de palmadas para educar.

 

Exemplar a atitude da mãe. Eu já estava achando-a fraca, dominada pela vontade de uma criança mimada. Na verdade, acho que ela demorou em tomar as rédeas da situação, receando o que os demais passageiros pensariam dela. Imagine se a denunciam por espancamento.

 

E ela temia com razão. Afinal estão transformando pais que educam em criminosos.

Hoje em dia, para alguns, respeitar a vontade de uma criança birrenta, mesmo que isso atrapalhe a vida de quase 200 pessoas, é o correto - o politicamente correto.

 

Fico imaginando as criaturas mesquinhas e egocêntricas que serão os adultos criados sem os limites óbvios e naturais impostos pelos bons pais - os verdadeiros bons pais.

 

Parabéns para aquela mãe. Teve coragem, bom senso e soube dosar o castigo físico e moral que impôs ao seu filho. Aquela lição ele aprendeu.

 

Maurício Palma Nogueira

 

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