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Em nossos momentos de intolerância (Vavá; F66
17/07/2018 - Por evaristo marzabal nevesAtenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.
Em nossos momentos de
intolerância
(Se é que existem outros)
Evaristo Marzabal Neves
Para alguns (ou muitos),
jamais passam. Basta ir à mídia e notar a predominância de atos, intenções,
fatos e consequências focados na intolerância. Ela está no mundo, nas
concepções religiosas, etnias, culturas,
estratificação social, faixas etárias, relações patronais e de serviços, na
política, nas ideologias, etc. Não é preciso ir longe, basta olhar para dentro
da casa.
A natureza humana é
intolerante. Começa com o seu vizinho. Se ele não comunga suas idéias, seu modo
de viver, suas manias, costumes e hábitos, está frito. Não serve para a sua
convivência e se você não pensa como ele, é a mesma coisa. Egoísticamente, para
não se ver machucado, se isola ou subestima o próximo. Julga-se incompreendido.
Busca a solidão como seu ambiente de tolerância e acredita, desta forma, que só
há liberdade na solidão. Não aceita as diferenças e, por assim agir, deixa de
entender que o tecido social é costurado pela convivência e conveniência.
Aliás, conviver é compreender as diferenças.
Interessante trazer à
reflexão parte de um editorial de Elifaz Andreato "Intolerância zero"
(Almanaque Brasil de Cultura Popular/ano 3, n. 32, Nov. 2001, p.2) que relata
que "a intolerância tem sido a mais perversa assassina da espécie humana.
O estranhamento ao outro, a não aceitação das diferenças: eis, ao longo da
história da humanidade, a mais estúpida motivação para o extermínio de milhões
de seres humanos... No Brasil, seu espectro está entre nós e os outros, nos
sinais de trânsito e nas periferias das grandes cidades, entre as torcidas de
futebol, entre classes políticas e religiosas, entre colegas de trabalho,
dentro de nossas próprias casas”.
“A intolerância nos opõe ao
outro, porque é portadora de duas verdades, duas certezas e nisso reside sua
atávica capacidade para desagregar e inviabilizar a convivência pacífica e
tolerante entre pessoas e povos”.
“Evoluímos tanto e, no
entanto, neste início de século 21, a intolerância nos devolve às cavernas,
refúgio primal, onde tudo começou milhões de anos atrás. Nascemos portadores da
intolerância, e isso exigirá dos homens de bem plena e permanente dedicação na
aceitação das diferenças nos outros, condição básica para que os outros aceitem
as nossas".
Mas será que isto é
possível? A intolerância já faz a maioria acordar de mal com a vida e com o
próximo, quando para Lia Diskin (jornalista especialista em Budismo) deveríamos
perceber que "o outro é aquele que nos dá identidade, em quem me espelho
para perceber-me" e, para o teólogo Leonardo Boff "o outro é aquela
realidade que me permite descobrir-me a mim mesmo como diferente e me
possibilita uma comunhão. É uma proposta à qual devo dar uma resposta".
É possível o outro, dar esta
contribuição para o crescimento e amadurecimento emocional e espiritual do
próximo? É, mas está muito longe para esta compreensão, pois o ser humano não
abre mão de seus preconceitos, discriminações e segregações manifestadas em
suas manias, crenças, cultura, hábitos e costumes diários. Por princípio, o ser
humano é intolerante, de tal forma que é difícil instalar o entendimento de
tolerância, que para Lia Diskin é que "não se basta que aceite as
diferenças, tenho que promover sua existência como fonte de riqueza e
alargamento do processo de humanização" e, para
Leonardo Boff nada mais seria do que "a capacidade de conviver com os
diferentes sem fazê-los desiguais e vendo-os como oportunidade de
enriquecimento mútuo".
Geralmente o mais egoísta é
o mais intolerante. Na clausura de seu narcisismo, idolatra o seu comportamento
e conhecimento. Prontamente se irrita no seu cotidiano, pois acredita e
fanatiza suas verdades e certezas.
Você, caro leitor, se julga
tolerante? Se for, aceite e pratique as colocações de Lia Diskin e Leonardo Boff.
Caso contrário, reveja seu comportamento, pois intolerância gera intolerância e
seu cotidiano é uma guerra sem fim.
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Evaristo
Marzabal Neves, Prof. Senior - Depto. de Economia, Administração e Sociologia,
ESALQ/USP.