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O Jogo do Fatiamento (Capão F85)
13/10/2015 - Por roberto arruda de souza limaAtenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.

O Jogo do Fatiamento
Se há algo que tem me preocupado é o desejo de fatiamento, de divisão da ESALQ em novas unidades. Em meio aos pensamentos sobre o tema, me ocorreu uma imagem de pura ficção que compartilho a seguir.
Certa feita, o governador do Estado de Nova
York acordou preocupado com as dimensões continentais dos Estados Unidos e os
problemas que o presidente norte-americano enfrenta. As mais variadas demandas
chegam a toda hora em sua mesa, preocupação, o que, na sua opinião, poderiam
inviabilizar uma boa gestão. O que seria prioritário: obras para conter
inundações e estragos de furacões ao sul, a seca e incêndios na costa oeste ou
a onda de frio que estava fechando estradas e aeroportos no nordeste? Como o
presidente do pais poderia dar a atenção adequada às demandas do Estado de Nova
York? Deveria haver muita ineficiência naquele gigantismo.
Naquele momento o governador teve uma
brilhante ideia: por que não separar seu estado dos demais estados? Já era
destacadamente o principal centro financeiro e, sem se preocupar em carregar a
economia dos demais estados, poderia focar sua competição com os centros
financeiros europeus e asiáticos.
Em convincente discurso, mostrou aos demais
estados que seria vantajosa a separação. Os Estados Unidos que tinham apenas um
voto em organismos internacionais passaria a ter tantos votos quantos forem os
estados independentes. Lembrou que diversos novos países haviam surgido na
Europa, elevando o número de votos nos organismos internacionais. O governador
trouxe o presidente da Sérvia para um interessante depoimento sobre como havia
sido importante a divisão da antiga Iugoslávia.
Os demais estados ficaram felizes com a
promessa dos ganhos e, conforme acordado, continuariam contando com o apoio de
Nova York para os assuntos financeiros. E a separação ocorreu.
Com o passar do tempo, os Estados Unidos
descobriram que havia se enfraquecido, assim como o Estado, agora país, de Nova
York. Sem a agricultura do Centro-Oeste, a tecnologia das empresas da Costa
Oeste, petróleo e tantas outras riquezas, apesar de toda sua reconhecida
capacidade, o centro financeiro de Nova York não parecia ser mais tão atrativo,
e parte dos capitais se transferiram para Ásia e Europa. Preocupado em
manter-se competitivo, não era possível dar o prometido suporte aos demais
estados. Nos organismos internacionais, o Estados Unidos, menor, não tinha a
mesma voz que China e Rússia (que preferiram não apenas evitar a divisão, mas,
ao contrário, até anexaram territórios. Dividido, os problemas permaneceram nos
Estados Unidos, mas com menos recursos para solucioná-los. Estados Unidos e
Nova York, incompletos, perderam o grau de investimento. Os Estados Unidos
lembraram da história de Inglaterra, Holanda e outros países, que abriram mão
de colônias fornecedoras de matéria-prima, mas nunca de tecnologia e agregação
de valor para manterem-se como potências.
Ao contrário de Politécnica, FFLCH, Pinheiros
e São Francisco, que terceirizaram a formação em disciplinas básicas (por
exemplo, com auxílio de Institutos de Física e de Biologia), mas mantiveram a
formação profissionalizante, o fatiamento da ESALQ será nas áreas
profissionalizantes. Não seria mais a ESALQ a responsável pela formação na área
de atuação profissional, como se o médico para ser pediatra precisasse cursar
as disciplinas ligadas à pediatria fora da faculdade de Medicina. A ESALQ não
estaria mais formando o Engenheiro Agrônomo em todas suas atribuições
profissionais. Adicionalmente, o conteúdo das disciplinas dessas áreas não
seria mais de influência da ESALQ. Assim, tópicos como contabilidade rural,
relações trabalhistas (o trabalhador rural difere em muito do urbano), direito
agrário, crédito rural, entre outros, não necessariamente receberão a devida
atenção.
Assim como a fantasiosa divisão dos Estados
Unidos, o fatiamento da ESALQ precisa ser melhor discutido. Não se trata de
negar a possibilidade de áreas e pessoas alçarem voos não possíveis na atual
estrutura, mas de analisar os impactos sobre a unidade remanescente. Como
conversava hoje com importante nome da ESALQ: não torceria contra um convite
para que ele fosse Ministro da Agricultura, mas ficaria muito preocupado com o
vazio que deixaria na Escola. O fatiamento pode ter defensores com os mais
diversos argumentos, mas a ideia não me agrada. O argumento de que todos
sairiam ganhando, ESALQ e novas unidades, faz recordar a máxima dos jogos de
cartas: "Se após meia hora de jogo você não identificar quem é o pato, é
porque você é o pato!"
Roberto Arruda de Souza Lima (Capão F85) é Engenheiro
Agrônomo, professor da ESALQ. Morou na República Biscoku