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Pequenas Imperfeições (Pinduca F68)

09/11/2015 - Por marcio joão scaléa
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Apesar de não ser um especialista, o Universitário tinha boas noções de topografia, tendo conseguido ser aprovado por média naquela matéria, façanha que menos da metade de sua classe conseguira. Talvez por isso tenha sido lembrado para participar de um grupo, liderado pelo Amigo 8, que havia sido contratado para fazer um levantamento topográfico em uma fazenda da indústria de calçados Samello, de Franca.

 

Detalhes acertados, teodolito emprestado, lá se foi a equipe para o serviço de campo, em Pedregulho, logo adiante de Franca. A indústria disponibilizara um apartamento espaçoso e confortável para a hospedagem do grupo, assim como custeava as refeições à noite, duas surpresas. A grata surpresa foi o restaurante, em que era servido o "Filé a JK", empanado, recheado com queijo e presunto, acompanhado por arroz e salada, inesquecível. Era um prato tão bem servido que era suficiente para três pessoas famintas. Se fossem duas a jantar, o garçon recomendava o Filé a Presidente, semelhante ao outro, só que menor. A outra surpresa foi com o apartamento, que apesar de excelente, cheirava muito mal, pois estava localizado exatamente no curtume da empresa.

 

Em três a quatro dias o serviço de campo foi concluído, e em mais uma semana o grupo retornou a Franca, para a entrega do trabalho ao principal executivo da empresa, o Sr.Wilson. Ele ficou tão satisfeito com a rapidez e a qualidade do levantamento, que após a entrega e o pagamento, chamou um funcionário e lhe ordenou :

- Leve os "engenheiros" ao armazém P.I.. Cada um irá escolher um par de sapatos, como cortesia da Samello.

 

No caminho, a inevitável pergunta :

- Por que armazém P.I.?

 

- P.I. quer dizer "pequenas imperfeições". São calçados quase perfeitos, mas que por qualquer pequeno problema não foram aprovados pelo controle de qualidade. Pequenas manchas no couro, fiapos nas costuras, cola escorrida, coisa pouca. Eles não são vendidos, ficando à disposição para doações, etc. Chegamos, podem escolher.

 

Era um galpão grande, talvez uns 500 metros quadrados, com pilhas e pilhas de caixas dos sapatos quase perfeitos, à disposição dos "engenheiros". Aí começou o drama do Universitário : ele calçava numero 42 ou 43, conforme o modelo do calçado, números esses quase inexistentes no galpão, pois a grande maioria era de numeração 38 a 41 ! A segunda decepção foi perceber que o sapato que mais lhe agradara, tipo mocassim, no numero 42 não lhe entrava no pé. A terceira foi ver que o numero 43 não parava no pé, de tão grande. A quarta foi compreender, que com outro modelo de amarrar, já não tão do seu agrado, ocorria o mesmo, pois o fato de ter cordões pouco ou nada mudava a anatomia da forma. E assim por diante, pilha após pilha, já agüentando as gozações dos outros, todos eles com suas caixas debaixo do braço. Até que se decidiu por um modelo até bonito, mas de uma terrível cor marrom-amarelada, numero 42, um pouco apertado. Ele imaginava que após dois a três usos o couro cederia um pouco e ele ficaria confortável no pé.

 

Ledo engano, pois na primeira vez  em que o calçou a costura se rompeu e o sapato virou quase um chinelo. Deste episódio veio a decisão, cumprida à risca há quase quarenta anos, de só usar botinas. Se possível, do Garotti, de Jardinópolis.


Marcio Joao Scaléa (Pinduca F68) é Engenheiro Agrônomo ex morador da Republica Mosteiro

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