Blog Esalqueanos
Ser um dirigente não é tarefa fácil (Vavá; F66)
07/02/2019 - Por evaristo marzabal nevesAtenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.
Ser um dirigente não é tarefa fácil
Evaristo
Marzabal Neves (Vavá F-66)
Em fins de 1960,
H. Mintzberg (da escola de administração humanista) elaborou um cuidadoso
estudo com diretores executivos e chegou a conclusão que os gerentes (diretor,
presidente, executivo, chefe, supervisor etc) executam, simultaneamente, 10
diferentes papéis, porém muito inter-relacionados. Estes foram agrupados em
torno de três temas: relações interpessoais (funções de figura de proa,
líder e ligação-este envolvendo a teia de relacionamento com seus pares), transferência
de informação com os papéis de monitor, disseminador (imediata
transferência de informação e comunicação do escalão superior para seus subordinados)
e porta-voz (levar informações das bases para escalão superior) e, o terceiro
tema, tomada de decisões com os papéis de empreendedor, controlador de
distúrbios (gerenciamento de conflitos), alocador de recursos e negociador.
Fui Diretor da
ESALQ (06/01/1995 a 05/01/1999), Chefe do Departamento de Economia,
Administração e Sociologia em dois mandatos (09/10/1999 a 08/10/2001 e
10/10/2003 a 09/10/2005) e Vice-Chefe neste Departamento em três mandatos
(29/10/2001 a 28/10/2003, 29/10/2007 a 28/10/2009, e, 29/10/2009 a 28/10/2011).
Ao longo desses 16 anos de envolvimento com administração universitária, principalmente
na função de Diretor e Chefe de Departamento, gerenciar conflitos em uma
instituição com mais de 500 pessoas (corpo docente e não docente) foi um dos papéis
mais difícil de arbitrar, pois é uma tarefa que produz tensão, exigindo
tolerância à mesma, compreensão e melhor entendimento da manutenção de um clima
organizacional saudável, além de ter atitude (segura e convicta) em situações
ambíguas, quando se tem pouca informação para lidar com estas situações. Onde
está a verdade?
Nestes casos, apelava
para um “aforismo sem juízo” de Daniel Piza que vem muito a calhar. É sabido
que em discussões, sejam familiares ou grupais ou qualquer outra, em que não se
chega a um acordo, é comum ver o mais velho (ou chefe) esbravejar e bater na
mesa dizendo: “a verdade é uma só”. Qual verdade? A dele (chefe). Daí, o
articulista Daniel Piza (falecido em 30/12/2011)) certa vez, em seus “aforismos
sem juízo”, relatar que “a verdade é uma só: a verdade, não é uma só”.
Tentei, por
inúmeras vezes, refletir, usar e praticar este aforismo em tomada de decisões,
que envolve arbitragem de conflitos, seja ele entre pessoas, entre essas e a
organização que dirigia (Diretoria, Chefia etc). Ao fazer a acareação de um dos
que estavam em conflito, ele se posicionava em sua defesa e apresentava a sua
verdade. Dispensado, convocando o outro, ouvia outra história sobre a mesma
ocorrência em que me contava a sua verdade. Pois bem, se a situação era
ambígua, em meu julgamento poderia estar formulando uma terceira verdade: a que
consegui formar ou estabelecer ao ouvir os dois em litígio. Qual é a verdade?
Neste sentido, é
que sempre tentei praticar mais vezes a linguagem dos três sensos, antes de
qualquer decisão. Na ordem: bom senso, consenso, e por último, só em ultima
instância, o dissenso. Neste caso, pergunto: quem é seu advogado, já que não há
possibilidade de nenhum acordo? Venha aqui e traga-o, pois a solução é judicial
ou administrativa (no caso universitário).
Agora, estariam
perguntando: aonde o Vavá quer chegar? O fato é que a tomada de decisão, como
outro papel do gerente, envolve negociação, que é, muitas vezes, mais arte do
que ciência, pois é necessário saber onde está a verdade e como fazer para que prevaleça
em sua defesa e da organização que dirige.
É comum em
determinadas situações presenciar manifestações, às vezes, individuais, ou
mesmo representando grupos, em que pessoas assumem posições, assinando
abaixo-assinados sem ter todas as fundamentações, ou unilateralmente, se
posicionar em algum evento “por ouvir dizer”. “Ouvir dizer”, qual verdade? Não
pode ser simplesmente massa de manobra ou um símbolo de “inocente útil”.
Para o
administrador de conflitos chegam as mais diferentes verdades, se houver mais
de duas pessoas envolvidas e, como “quem conta um conto, aumenta um ponto”, as
verdades
“se esticam” e
se perdem. Não é o que está ocorrendo na atualidade com a “Lava Jato”? Em quem
acreditar? E a tal da “delação premiada”?
No caso da
Universidade Pública, as verdades podem estar inseridas na observância e no
cumprimento de seus deveres e obrigações, lastreados nas normas legais
(estatuto, regimentos, portarias, resoluções, contrato de trabalho, etc.), pois
somos servidores da USP e não o contrário. Neste sentido, sempre tomei o
cuidado, em qualquer posição diretiva, de verificar antes as minhas
competências, para não “atravessar” e “atropelar” as normas estabelecidas e não
gerar desvio de conduta. “Dura lex, sed lex”, se assim não fosse, estaria
estabelecido o caos, uma “Torre de Babel”, onde a desobediência seria
incontrolável.
Procurava chamar
a atenção, sobre o desperdício de tempo e o alto custo institucional da
discussão da desinformação que atrasa o andamento da instituição. Toda
discussão deve ser bem fundamentada, com coerência e conhecimento. Caso
contrário, é para acreditar nas reflexões (ditos populares): “se não consegue
convencê-los, confunda-os” ou “se não consegue vencê-los, alicie-os”.
Gerenciar é
arte, é ter decoro (educação e civilidade), é procurar ser ético e não causar constrangimento,
indignação e revanchismo. “As pessoas não se ofendem pelo que você fala e sim
pelo MODO como você fala ou o que a fez sentir”, e, nestas ocasiões, a razão e
o conteúdo se perdem e ficamos no contexto da agressão verbal e desrespeitosa,
verdadeiros atrasos. Educação e civilidade cabem em qualquer discussão.
Finalmente,
tentei em minhas decisões estar atento a conceitos preconcebidos que poderiam
influenciar meu julgamento de valor. Procurei ser justo dentro das normas
vigentes e que servem para todos; neste caso, procurei sempre aplicar
princípios éticos de decisão, e, mais uma vez, entendendo minhas competências, meus
deveres e obrigações para que pudesse, tranquilamente, gozar de meus direitos.
Fica um questionamento final: será que não
errei também? É bem provável. Dependendo de seu quadro de referência, você não
e dono de toda verdade. Daí entender e compreender no tempo, que ser dirigente
não é uma tarefa fácil.