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Suicídio colorido - além do setembro amarelo (Dema; F05)

28/09/2020 - Por rodrigo pazzinatto de almeida leite
Atenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.

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Saudações esalqueanas! O final de setembro se aproxima e queria deixar aqui minha contribuição para falar sobre o Setembro amarelo, o mês escolhido para falar sobre suicídio. Falar de morte não é assim tão fácil, especialmente quando falamos sobre alguém que tirou a própria vida, a fim de dar cabo ao sofrimento. Entendo a importância de falar sobre o assunto o ano todo, e nesse mês, gostaria de dar mais cores ao tema para dar um destaque especial à população LGBTQIA+. Tal destaque fundamenta-se em dados científicos que mostram que a tentativa de suicídio é de 2 a 7 vezes maior nessa população. Além disso, um estudo americano mostrou que 24% dos suicídios de adolescentes (12 a 14 anos) eram desse grupo. Quanto mais jovem, maior o risco de suicídio. Quando falamos em pessoas trans, especificamente, a taxa de prevalência de ideação suicida e tentativa de suicídio são de 67% e 35,5%, respectivamente. Os números são preocupantes e alarmantes! Pais, mães, tios, familiares e amigos esalqueanos: esse tema permeia a família de todos. 


Talvez se os alunos estivessem em aulas presenciais, seria possível debater o tema em rodas de conversa, o que seria muito mais legal. Porque suicídio não é apenas sobre ler e escutar, mas também sobre falar, verbalizar.


Um ponto que chama a atenção é uma série de sintomas vivenciados pelos LGBTQIA+, muitas vezes enquadrados em diversos diagnósticos psiquiátricos como depressão, transtornos de humor, transtorno de ansiedade, TEPT (Transtorno de estresse pós traumático) e outras comorbidades. Quando falamos nesses diagnósticos, não podemos perder de vista a relação direta que eles têm com os aspectos sociais, com a maneira como o indivíduo vive e se relaciona na cultura. Para esse grupo, a existência é atravessada pela discriminação.


O indivíduo discriminado tem como alvo aquilo que ele tem de mais importante para sua existência: o pertencimento. Ao ser discriminado em tantas esferas (família, religião e sociedade), ele não pertence a nada. O indivíduo se frustra. Em uma sociedade do desempenho em que cada vez mais as pessoas são cobradas por produtividade e obtenção de resultados, a pessoa LGBTQIA+ acaba vivendo um excesso de peso e responsabilidade, que ele introjeta para si. Como seu pertencimento é frustrado, ele fica às voltas com um grave risco de comportamento suicida. Sem ter com quem se abrir, não lhe restam opções.


O jovem LGBTQIA+ vive com uma estrutura nada acolhedora. O estigma com a identidade, como preconceito e discriminação podem ser vistos sob três aspectos. Além do preconceito da sociedade, o jovem tem que lidar com a expectativa de preconceito, ou seja, uma espera de rejeição, e com a homofobia internalizada. Esta última, tendo alta relação com o comportamento suicida de jovens.


O contexto religioso também é importante quando falamos em suicídio dessa população, especificamente, pois estudos encontraram maiores chances de pensamentos suicidas em adultos jovens que amadureceram em contexto religioso, quando comparado aos grupos LGBTQIA+ que amadureceram fora do contexto religioso.


Um estudo Australiano que entrevistou familiares de LGBTQIA+ suicidas aponta que a falta de aceitação, tanto da família, como de si mesmo, estão relacionados a esse tipo de evento. Adicionado a isso, aparecem questões relacionadas ao "sentimento negativo sobre a própria sexualidade" e a insatisfação com a aparência, que me parece estar ligada à identidade e expressão de gênero. Esse estudo também identificou que nos 2 anos que antecederam o suicídio, foi relatado comportamento agressivo e histórico de abuso, tanto físico como sexual. Essas questões acendem um alerta para possíveis fatores preditivos, o que inclui abuso de álcool e drogas, ansiedade e depressão.


O suicídio entre jovens LGBTQIA+ acontece no contexto em que existe um sentimento profundo de desesperança perante a vida. Penso que a esperança pode ser dada a todos. Cada um refletindo sobre os próprios preconceitos e o quanto podem contribuir para acabar com toda forma de discriminação. É dolorido entender que, às vezes, o preconceito está em nós mesmo. Sei por experiência própria.

 

Dema (F05)

Esalqueano, ex-morador da República Xapadão, LGBTQIA+ e 10° período de Psicologia. Autor do livro Deslaços de Família (https://www.amazon.com.br/Desla%C3%A7os-Familia-Rodrigo-Pazzinatto/dp/8566256654)

 

Referências:

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